Nomes do Naturismo – Maria Luzia
Publicado por Os Naturistas

Nomes do Naturismo – Maria Luzia

O Portal OS NATURISTAS, entrevistou Maria Luzia, a primeira presidente mulher da FBrN – Federação Brasileira de Naturismo

Luzia, gentilmente recebeu o Portal OS NATURISTAS, para esta entrevista que vocês conferem abaixo

Portal OS NATURISTAS – Quem é  Maria Luzia?

Luzia – Me chamo Maria Luzia Almeida de Almeida nasci em 20 de maio de 1955, em Cachoeiro de Itapemirim, ES, terra da Dora Vivacqua, a Luz del Fuego, madrinha do Naturismo brasileiro. Casada com Gilson Ribeiro desde 1977, dois filhos Leticia e Lucas, trabalhei em TVs afiliadas da Globo e da extinta Manchete, assessorando as diretorias comercial e executiva. Durante alguns anos atuei como comerciante no segmento feminino mas, atualmente, co-sócia de um PET Salão de Beleza e Estética Animal. Eu e Gilson fomos co-fundadores de 2 entidades naturistas: a NatES, que administra a Praia de Barra Seca, inaugurada em fevereiro de 1994, e o extinto GNC criado em 2008, com término em fevereiro de 2020. Infelizmente, o GNC acabou exclusivamente por falta de naturistas que possam gerenciar a entidade, organizar encontros e eventos.

Portal OS NATURISTAS – Como você conheceu o naturismo, e como foi sua entrada neste estilo de vida livre de roupas?

Luzia – Saímos de Vitória, ES, para irmos pela primeira vez a uma praia oficial de nudismo. Quanta emoção! O ano era 1990; eu com 35 anos e meu marido Gilson com 37. O local: Praia do Pinho, Balneário Camboriú, Santa Catarina.

Uns dois anos antes, a extinta revista Manchete havia publicado uma matéria sobre uma praia de nudismo no sul do país que vinha sendo freqüentada por muitos brasileiros e estrangeiros, principalmente, argentinos.

Mas a matéria não ensinava o roteiro para ir até lá. Escrevemos uma carta ao jornalista Tarlis Batista e recebemos dele um telegrama informando os contatos com Celso Rossi, presidente da FBN – Federação Brasileira de Naturismo.

O Celso nos respondeu explicando que o movimento que se formava era de NATURISMO e não NUDISMO como estávamos sempre acostumados a ouvir falar: “campos de nudismo”. Mas qual a diferença? Seriam hippies? Vegetarianos? Poderíamos fumar? Beber? Quantas dúvidas!

Viajamos de avião e chegamos de táxi ao Paraíso da Tartaruga, clube naturista anexo à Praia do Pinho. Um Tarzan, nu, veio nos recepcionar: era o Celso, desacompanhado da esposa, Paula, que acabava de dar à luz ao primeiro filho.

Para quebrar o nervosismo brinquei perguntando: – mim Jane, you Tarzan? Rimos todos, ele nos deu as boas-vindas, nos mostrou as dependências do clube, falou das normas do local e nos acomodou num chalé de madeira localizado numa pequena reserva florestal. O chalé estava todo decorado com faixas, corações, flores, etc, porque um casal havia passado alí a lua de mel. Bom começo!

Gilson logo tirou a roupa, se acomodou numa cadeira de praia e foi pitar seu cigarrinho. Poderia fumar?

Eu continuei vestida. E estática! Só consegui balbuciar: – “não vai dar certo!”

Algum tempo se passou e fiquei “fingindo” que arrumava as “roupas” que levamos.

Não saberia precisar o tempo, mas despertei dos meus pensamentos quando percebi um casal chegando com duas crianças, de aproximadamente uns 10 anos. Foi então que comecei a olhar em volta percebendo muitas barracas montadas, fechadas, imaginando que naquele horário os proprietários deviam estar na praia. Outros chalés se integravam à paisagem, misturados à mata, além de uma grande construção de madeira que estava sendo erguida pelo Celso e dois ajudantes para ser o que chamariam de Albergue.

Eu continuava vestida!

De repente, assustei-me com uma voz fininha agarrada em mim perguntando-me se eu não iria tirar a roupa. Era a garotinha que chegara com os pais, que depois soube chamar-se Sara. E ela já estava nua!

Passado o impacto daquela carinhosa recepção infantil, pude perceber que eu continuava vestida numa área de Naturismo. Pensei: – se uma garotinha, com 9 aninhos, muito magrinha, está nua porque eu com 35 anos continuo vestida?

Tirei a roupa!

Gilson continuava lá, imóvel, curtindo cada inspirada de ar puro. Acho que ele, realmente, estava em transe!

Mas eu continuava perdida, meio sem saber o que fazer numa área de Naturismo. Um novo casal estava chegando para acampar, cumprimentamos-nos ligeiramente, conversamos algumas coisas básicas, tipo conversas de quem ainda não se conhece.

Achei melhor aproveitar a tarde para dormir e relaxar.

No cair da noite fomos convidados para uma festinha surpresa, pois seria comemorado o aniversário de Paula, e os muitos amigos iam chegando trazendo produtos para um churrasco. Fomos apresentados a todos, integramos ao grupo e aquela noite foi muito agradável. Fazia um friozinho gostoso, embora fosse verão, a maioria estava vestida e uns poucos estavam nus. Eu já começava a me sentir bem relaxada , talvez porque estivesse toda vestida no meio de alguns nus. Era a nossa primeira experiência entre os Naturistas.

Na manhã seguinte, faríamos a tão esperada estréia na Praia do Pinho. Logo que acordamos descemos para a praia. A “prova de fogo” estava para acontecer: teríamos que passar dentro da área dos homens desacompanhados para chegar até a área das famílias. E como era alta temporada de verão, a área estava bem lotada.

Passamos bem rápido para não ter que olhar, nem ser olhada. Mas Gilson continuava feliz, relaxado e curtindo tudo. Porque homens e mulheres são tão diferentes em emoções?

Mas logo algo me chamou a atenção: uma camisa de uma loja de nosso Estado, a Dadalto, bem na nossa frente, fazendo exposição na portaria da praia, dando-nos a certeza de que havia capixaba na área.

Passamos meio despercebidos e fomos nos sentar para aproveitar o lindo dia que iniciava, com sol e muito calor. Porém, mal nos assentamos, foram nos chamar para irmos até a portaria da praia. O que queriam conosco? Logo imaginamos que seria para preencher alguma ficha, etc, mas a Rose Espíndula, uma das fundadoras da praia que havíamos conhecido no dia anterior, nos chamava para apresentar o capixaba, Márcio Braga, que também fazia sua estréia naquela praia. Ele, por estar sozinho, não podia entrar na área das famílias e permaneceu durante muitos dias ajudando na portaria fazendo recepção aos que chegavam.

Ficamos uma semana naquele paraíso, conhecemos muitos naturistas, conversamos bastante e aprendemos que Naturismo não era simplesmente se despir das roupas. Esta era a parte mais fácil do Naturismo. Aprendemos que “Naturismo era um modo de vida em harmonia com a natureza caracterizado pela prática da nudez em grupo com a intenção de encorajar o auto-respeito, o respeito ao próximo e o cuidado com o meio ambiente.”

Fomos embora determinados a ter uma praia naturista em nosso Estado.

Três anos se passaram.

Neste período nos filiamos à extinta RioNat e constantemente participávamos dos eventos organizados pelo grupo, comandados por Sérgio de Oliveira. Com eles, inauguramos a Praia Brava, em Cabo Frio, reiniciamos as atividades na praia Olho do Boi, em Búzios e freqüentamos a Fazenda Alegria, no Rio de Janeiro, onde as atividades eram realizadas.

Neste três anos fizemos muitas buscas pelo litoral sul capixaba tentando encontrar uma área onde pudéssemos implantar o nosso próprio projeto naturista.

Em abril de 1993, lembrei-me de Márcio Braga e falei para Gilson que iria tentar localizá-lo na empresa de energia elétrica onde ele trabalhava. Para nossa alegria, logo o achamos e ficamos sabendo que ele também procurou por uma área onde pudesse praticar o Naturismo, informando-nos que havia ido ao litoral de Linhares pesquisar uma área liberada para a prática de nudismo através de uma informação publicada no Guia Quatro Rodas. Esta notícia teria sido “plantada” pelo ex-prefeito de Linhares ES Luiz Durão, que após a implantação do balneário Pontal do Ipiranga, apostou nos nudistas para desenvolver o turismo na região, plagiando Trancoso-BA, que teve sua divulgação nacional através da praia liberada para o nudismo.

A área de nudismo o Márcio Braga não encontrou, mas conheceu o Secretário Municipal do Meio Ambiente, Fábio Gama. Conversando, descobriu que existia uma praia totalmente deserta onde se poderia implantar um projeto porque era bem isolada e o acesso se daria através de barco, o que dificultaria a chegada de curiosos, mantendo a privacidade e tranquilidade dos naturistas.

Mas o Márcio não se lembrava ao certo onde encontrá-lo em Linhares, e disse-nos que iria procurar por maiores informações. Alguns meses se passaram sem que voltássemos a nos falar.

Naquele mesmo ano, em agosto, lembramos daquela conversa com o Márcio e decidimos procurá-lo novamente. Rapidamente ele achou os contatos com o Fábio e nos repassou.

Imediatamente ligamos para ele que nos convidou para passarmos lá o feriado de 7 de setembro, que se aproximava. Convite aceito, fomos conhecer a nossa “possível” praia de Naturismo, saindo em caravana com nossos filhos, além do Márcio Braga, esposa e filhos.

Mas o que seria um agradável passeio tornou-se muito cansativo porque percorremos 180 km de Vitória até Linhares e mais 60 km de estrada de terra, chateando as crianças, com 9 e 13 anos. Quando chegamos ao local combinado, uma choupana de palha na beira-mar, perguntamos a um Senhor se aquela seria a propriedade do Sr. Fábio Gama, tendo ele nos respondido ser uns 20 km adiante. Resposta que provocou uma reclamação geral. Mas era uma brincadeira do próprio Fábio Gama.

Fomos carinhosamente recepcionados por ele e sua esposa Rosângela, e hospedamos-nos numa casinha de praia no sítio deles.

E naquele mesmo dia, um delicioso feriado de 7 de setembro de 1993, encontramos a nossa Praia Naturista de Barra Seca, onde ficamos a bandeira da NaTES -Congregação Naturista do Estado do Espírito Santo.

Imediatamente, entramos em contato com a FBN, obtendo todo o apoio e orientação através de Celso Rossi, que nos direcionou para que pudéssemos montar um projeto que ganhasse solidez.

Após várias reuniões agendadas por Fábio Gama com a comunidade local, comerciantes e moradores do balneário Pontal do Ipiranga, administradores municipais, autoridades e entidades ambientais, recebemos o aval e inauguramos a Praia Naturista de Barra Seca no dia 05 de fevereiro de 1994, contando com a presença de uma caravana de naturistas integrantes da RioNat, da imprensa em geral e de alguns naturistas capixabas que apareceram porque acompanhavam através das diversas matérias que avisavam sobre o dia da inauguração da primeira praia oficial de Naturismo da região Sudeste.

Naquele dia a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros se fizeram presentes enviando seus soldados e salva-vidas.

Houve uma solenidade no final da tarde, com a presença de algumas autoridades, com discursos do chefe de gabinete do prefeito, do presidente da NatES e do Fábio Gama. O pessoal do Projeto Tamar marcou o evento com a soltura de quase 200 tartarugas marinhas nascidas naquela noite. Contam que por volta dos 30 anos, quando estiverem adultas, elas voltarão ao local onde ganharam o mar.

Além da ajuda incondicional do Fábio Gama e de sua esposa Rosângela, recebemos o apoio do prefeito do Município de Linhares ES, José Carlos Elias, que autorizou a implantação de uma pequena infra-estrutura na praia para o conforto dos naturistas. Também recebemos a colaboração do órgão Ibama, com doações de madeiras ecológicas, do pessoal do projeto Tamar que encontrou nos naturistas apoio para o projeto de proteção das tartarugas marinhas, da empresa Antártica com patrocínio e doações de mesas, cadeiras, barracas de praia e diversas placas. Também o Sr.Toninho e seu filho Silvio -cuja propriedade localiza-se em frente à praia, que montaram a Cabana Barra Seca para receber os naturistas e fazer a travessia do barco, além dos diversos comerciantes do Pontal do Ipiranga: Ozéas, Justino, Orlando, Nice (famosa pintora capixaba, já falecida) e seu marido José Augusto, também falecido.

A primeira diretoria da NatES – Congregação Naturista do Estado do Espírito Santo foi composta pelo presidente, Gilson Ribeiro de Almeida, vice-presidente, Márcio Ramalho Braga, secretária, Maria Luzia A. de Almeida e tesoureira, Ângela Biral Braga.

A paixão pelo Naturismo e o envolvimento foi tão forte que presidi a FBrN, Federação Brasileira de Naturismo, de 2001 a 2003.

Vinte e sete anos já se passaram!

Portal OS NATURISTAS – O que o naturismo representa hoje na sua vida?

Luzia – O Naturismo foi transformador em minha vida desde que estreei na Praia do Pinho, quando conheci uma filosofia ou modo de vida inclusiva, agregadora, sem separatismos onde todos são iguais estando nus. Para quem entendeu o significado da filosofia naturista, também aprendeu que o respeito é fundamental, respeito a si, ao próximo, à natureza, às diversidades, idéias, ideologias, etc. Estamos há quase 2 anos sem frequentar ambientes naturistas em função da pandemia, mas sonhamos com o momento em que estejamos todos juntos novamente..

Portal OS NATURISTAS –  Você presidiu a FBrN entre 2001 à 2003, de lá para cá, houve mudanças significativas?

Luzia -Presidi a FBrN de 2001 a 2003 quando ainda era a antiga FBN e possuía CGC. Por solicitação da INF, e por recomendação de Celso Rossi, alterei para FBrN para distinguir da Federação Belga. Quando assumi a FBN, não existiam afiliados, a federação estava quase sendo desativada porque Celso Rossi dedicava-se ao novo projeto Colina do Sol e não havia quem quisesse assumir. Numa conversa com o querido amigo, já falecido, Sérgio de Oliveira, que estava presidente interino, fui convidada a assumir a federação porque eu era muito ativa na NatES. Não houve eleição porque não havia afiliados. Num primeiro momento, decidimos organizar em 2001 o 1º Encontro do Terceiro Milênio, convidando por telefone representantes de áreas para o encontro do Recanto Paraíso, em Piraí. Foi um sucesso! Vários naturistas compareceram e se conheceram porque até aquele ano as áreas não mantinham contatos e não se relacionavam. Nesta ocasião, definimos que em 2002 faríamos um Congresso Naturista fora do eixo Praia do Pinho / Colina do Sol. Novamente, o Recanto Paraíso foi o clube anfitrião do Congrenat quando foi eleito o Elias Alves para presidir a FBrN de 2003 a 2005. Muitas mudanças aconteceram a partir da posse do Elias. Nesta ocasião, diversas áreas já estavam afiliadas e o Elias, inclusive, quitou com suas posses uma dívida da FBrN com a INF de compra de selos. E o Brasil começou a marcar presença com delegação nos Congressos Internacionais, O Celso Rossi já havia participado de uns 2 congressos internacionais representando o Brasil. O auge do Naturismo brasileiro foi o Congresso Internacional, em 2008, na Praia de Tambab – PB.

Portal OS NATURISTAS – Como você avalia o naturismo no Brasil?

Luzia – O Naturismo brasileiro cresceu muito nos últimos 15 anos, quando muitas novas associações foram criadas em diversas regiões brasileiras. Porém, ainda falta consciência e comprometimento dos naturistas para ajudar na manutenção da áreas públicas que não recebem ajudas financeiras. Igualmente, as entidades que organizam encontros em sítios e chácaras precisam de grupos que frequentem, ajudem financeiramente e fisicamente na organização não deixando para poucos a organização dos encontros. A maioria quer encontrar tudo pronto pagando pouco.

Portal OS NATURISTAS – Você acredita que a mulher encontra mais resistência no naturismo?

Luzia – Os homens ainda são criados mais livres, diferente das mulheres que ainda são resistentes à nudez, até por questões estéticas. Sempre ouvi de muitas mulheres que “até seriam naturistas se tivessem um corpo que acham ser ideal”, ou “que primeiro fariam uma plástica total”, etc. Infelizmente, estas mulheres não conhecendo a filosofia naturista pensam no Naturismo ligado à paquera e ao prazer sexual, são resistentes à nudez mas não se incomodam de estarem quase nuas nas praias usando pedacinhos de panos. Ao longo de mais de 30 anos de Naturismo também presenciei homens que frequentaram, mas não permitiram a presença de suas esposas.

Portal OS NATURISTAS – Qual o seu conselho para quem quer ingressar no naturismo?

Luzia – Procurar informações prévias sobre a filosofia naturista, frequentar áreas filiadas à FBrN e grupos e associações que observam o código de ética naturista e, principalmente, que as mulheres jamais devem frequentar “obrigadas” apenas para satisfazer os desejos do companheiro porque acredito ser uma violação, submissão e manipulação. Conheci diversas mulheres que durante muito tempo tiraram a roupa por imposição dos companheiros.

 Por Celso Costa, editora N

Equipe OS NATURISTAS

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